Antes tarde...
Como saiu justamente no dia das mães, foi aquela correria. Acabei
não postando a crônica do mês no Pandora, mas é como reza o ditado.
Foi assim que minha mãe me ensinou.
Para a minha amiga Mary
Elas se encontravam eventualmente, e sempre havia uma cordialidade
pairando no ar nesses momentos. Foi quando a morte deixou como herança para
minha pequena família pertences que não se doam ou não podem ser jogados fora,
como aquele álbum de fotografias da formatura da turma de odontologia da UFMG
na década de 80. Mary havia sido colega do meu tio Marco. Nenhum dos dois virou
dentista. Minha mãe, por sua vez, diante das lembranças e de tamanha tristeza
sorriu ao reconhecê-la naqueles registros longínquos.
Não sei precisar quando os encontros das duas viraram marcados. Só
me lembro da alegria da minha mãe dizendo que seria uma das musas inspiradoras
da nova coleção de ninguém menos que Mary Design! Por trás da marca que virou
praticamente o sobrenome dela – poucos dizem Arantes – e é reconhecida em
território nacional pelo bom gosto e pela feminilidade, há uma mulher tão
delicada e generosa quanto justamente a perfeita tradução do tema que escolheu
para a temporada, certamente atemporal.
A designer selecionou um time de mulheres incomuns para elaborar
muito mais que acessórios. Imagino que traduzir personalidades tão distintas em
colares, anéis e brincos não deva ter sido tarefa fácil. Digo isso pela minha
mãe... Ela viveu fora do Brasil nos anos 70, foi da geração hippie
supercolorida, mas adora uns ícones, digamos, góticos (eu e minha irmã, por
exemplo, somos chamadas carinhosamente de morceguinhos por ela).
Durante o processo de pesquisa da Mary, acabei ouvindo relatos da
minha mãe sobre as afinidades das duas, suas surpresas ao remexer seu baú
afetivo, a tarde divertida no ateliê da designer, o café da manhã das musas
inspiradoras, a empatia com a turma do estúdio Chá Gelado, que fez uma série de
vídeos sobre a coleção. Essa indizível sensação de sentir-se querida acabou por
virar um presente não apenas para a minha mãe.
Entrevistei a Mary algumas vezes. Desde o primeiro momento, anos
atrás, percebi que fazia parte de um tipo raro. Como se seu talento não fosse
suficiente, ela nunca deixou a doçura de lado, ao oferecer um café passado na
hora com bolo de laranja, assim que você entra em seu showroom nada impessoal,
por exemplo. Particularmente, sempre peço para visitar o jardim dos fundos para
observar detalhes, como a plaquinha com uma frase de Rubem Alves na parede.
Por causa da sensibilidade de Mary, que mostrou a um punhado de
gente um pouquinho da mulher maravilhosa que é minha mãe, agora ela me parece
mais uma amiga de longa data que uma fonte para reportagem. Sei que com amigos
a gente não fica cheio de dedos e formalidades, mas eu não consegui, até o
momento, agradecer a ela por todo carinho. E carinho, ainda mais num mundo cada
vez mais indiferente, a gente não só agradece como tenta, na medida do
possível, retribuir.
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