Andando por aí...

Gosto de andar por ruas que pouco conheço. Em endereço novo, mudo minha rota com frequência para poder observar as casinhas que restam, os quintais escassos, as janelas com telas, plantas no parapeito ou simplesmente abertas. No Santa Efigênia há mercadinhos e armarinhos que parecem de cidade do interior. Eles constrastam com muros pichados, novos prédios e carros barulhentos. Mais do que dizer aonde eu posso comprar pão ou jornal na redondeza, sei que a duas esquinas abaixo da minha rua existem damas da noite no meio do quarteirão e também um boteco desses que parecem vender ovo cozido azul.

Gasto o tempo livre juntamente com a sola do sapato. Hoje ao sair do salão no Funcionários (onde cometi uma traição com aquele que corta meus cachos por tantos anos que perdi as contas), resolvi não pegar ônibus ou táxi. Decidiria no trajeto se o melhor era voltar para casa ou ir ao cinema. Porque comecei o dia inspirada, depois dei uma murchada com algo bacana que eu esperava que acontecesse e não rolou simplesmente. Muitos passos até a avenida e a resolução do impasse estavam por vir. Enquanto isso, li o emblemático "mudança" num caminhão, acompanhei o ritmo de uma velhinha amparada por uma enfermeira em seu caminhar, tentei reconhecer novas vitrines.

Não sei porquê parei diante de um lugar com a parede lilás. O cheiro amadeirado foi um convite para eu entrar. Diante de diversos incensos e mandalas (tenho esse lado riponga), surgiu uma mulher com uma expressão tão serena...Também não sei porquê, em segundos, comecei a contar tudo sobre mim. Um tudo recente, essa avalanche 2010-2011. Era Saturno, dizia ela. E foi assim que me convidou a ver como os planetas do meu mapa estavam transitando confusos enquanto euzinha andava pelas ruas procurando a tal poesia cotidiana. A mulher de ar tranquilo me deu uma essência, conselhos de purificação e, mais que qualquer fórmula mágica imaginada pelo leitor, um ombro amigo.

Porque tem coisas que às vezes a gente não diz mesmo nem para os amigos. Ou não fica repetindo como um disco arranhado.

E escrevendo essa crônica, que nem é das mais inspiradas, coincidentemente anotei de uma revista que estava lendo na espera do salão uma pequena delicadeza que sintetiza e coloca, talvez, a dose criativa que faltou nas minhas linhas.


"As coisas não querem ser vistas por pessoas razoáveis. Elas desejam ser olhadas de azul".


Só podia ser o Manoel de Barros

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