O fim do diploma?

Como o assunto atinge minha área de formação e, por enquanto, de atuação, eu não poderia deixar de opinar sobre o "calcanhar de Aquiles do dia" da maioria dos jornalistas brasileiros (ao menos pela minha constatação no fórum do Comunique-se e no twitter): o fim da obrigatoriedade do diploma por meio da votação no Supremo Tribunal Federal.

Em alguma ocasião (talvez na época da faculdade), eu posso até ter achado legítima a tal conquista do canudo. Mas desde que me formei, penso na exigência como uma bobagem. Apesar de todo o meu desencanto alimentado ao longo de quase 11 anos de estrada, fiz vestibular para comunicação porque acreditava ter vocação para a coisa. O jornalismo foi uma escolha precoce, já que nos tempos de escola criava fanzines e até uma "emissora de rádio" que operava na hora do recreio. Comunicação (para o bem e para o mal) está no meu código genético.

Eu quis ser jornalista porque aquele universo um dia me fascinou: da apuração do fato (não do recebimento do release pronto e mastigado) à correria do fechamento e suas eventuais desventuras em série. Há um prazer indescritível em se realizar uma boa entrevista. Quando digo boa, não me refiro àquela troca de gentilezas entre entrevistado e entrevistador. Uma "alfinetada" na dose certa - e dependendo da circunstância e necessidade, óbvio - tem seu lugar e isso só se dá também à custa de muita pesquisa, informação e "feeling". Então, quando se deseja algo não interessa se alguém irá validar isso com um diploma.

Sempre afirmei que a faculdade para mim foi apenas um consórcio. Me dei conta disso no segundo ou terceiro período, quando ingressei no meu primeiro estágio. A prática destoava bastante de toda aquela teoria ministrada por muitos professores que ou estavam fora do mercado ou possuíam um único referencial. Eu só assimilei disciplinas como filosofia, sociologia, artes. Contudo, resolvi seguir para ver no que dava. Para os meus pais não deixaria de ser uma conquista importante (não essencial) ver a filha concluir uma faculdade (temos que lembrar que moramos num país que até pouquíssimo tempo atrás só acessibilizava o ensino superior para quem tinha condições financeiras para tal ou um esforço incansável para batalhar uma vaga em universidades públicas, sem cursinho ou mordomias do tipo. Nenhum dos meus avós passou do ensino médio, só para constar).

Uma pena que somente na casa dos 30 vejo que seria melhor "fechar o livro e ir viver", como já disse o poeta. Entrei no curso com apenas 17 anos. Poderia ter rodado o mundo com a grana da mensalidade, aprender sobre diversas culturas, falar outras línguas. E só agora isso tudo cai por terra? Não, não é essa "desobrigação" que gera um certo arrependimento. Foi minha imaturidade na escolha da carreira. Eu devia ter adiado por um tempo uma decisão tão importante.

Eu acho que no mundo ideal (vá lá, meu "mundo de Malboro"), eu poderia ter tido a chance da prática antes de optar por aquilo que faria o resto da vida porque estagiário, em geral, é preservado de certas pautas recomendadas, da falta de visão de certos superiores, de qualificação de certos colegas...O fim da necessidade de diploma pode trazer essa perspectiva. Isso pode ser melhor para o jornalismo a médio e longo prazo, ainda mais se considerarmos que ele mergulha numa grande crise.

Ter ou não um diploma não exclui ninguém de um compromisso ético. Ética a gente aprende em casa e leva para toda existência. Ter ou não um diploma não torna nenhum profissional especialista na maioria dos assuntos. Leio, ouço e vejo muita porcaria mesmo de "bacharéis" que se metem a tratar de cinema, artes plásticas, música, moda só para citar aquilo em que me "especializei" dentro do jornalismo. Ter ou não diploma, não exime o cidadão do compromisso com o outro, com o revelar dois lados da mesma moeda e ter o mínimo de senso de justiça. Por fim, ter ou não diploma não torna ninguém melhor que ninguém.

De todo chororô que acompanhei hoje, o mais lamentável foi o desconforto de alguns jornalistas na comparação com um cozinheiro, que foi feita pelo Ministro Gilmar Mendes (por quem não nutro nenhuma simpatia, aliás). Alimentar é extremamente digno e essencial à sociedade tanto quanto recolher sacos de lixo, fazer uma cirurgia de alto risco, defender um caso complicado, planejar a construção de um prédio, cuidar da segurança de uma rua dentro de uma guarita...

Há muitos cursos não regulamentados - em comunicação temos publicidade, por exemplo -, sem sindicatos fortes (o dos jornalistas para mim só faz barulho e mais nada) e isso não é drama, é apenas motivação para lutar por condições mais justas e melhores remunerações. Quem tem talento e profissionalismo não fica sem boas oportunidades (emprego é uma palavra complicada).

Para encerrar, gostaria de pontuar que tenho grandes amigos atuantes em redações e assessorias (e não se graduaram no curso de jornalismo necessariamente) e superam requisitos que a sociedade poderia esperar de um profissional da área: escrevem extremente bem, possuem noção global dos processos, têm faro, curiosidade, criatividade, sensibilidade, ética, comprometimento. A estas pessoas incríveis, dou as minhas "boas-vindas" ao clube. Ainda que eu espere acionar meus planos B e C um dia.

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