Portinha

Passei quase um ano em frente àquela portinha, sem nem saber o que havia por trás. Espremida entre salões de beleza, lojas de suplementos alimentares, bancos e farmácias. Foi a moça dos Correios que sugeriu, na semana passada, que eu fosse lá comprar uma embalagem. Ela, aliás, é uma entendedora de um tempo que não liga para o frenesi das novas tecnologias, age lentamente e nos leva para algum lugar chamado saudade. A moça dos Correios sempre dá notícia dos fregueses habituais, idosos, que colecionam selos, mandam cartas para parentes e se recusam a entrar na fila preferencial porque não se sentem velhos.

Entrei na portinha, um armazém. Imediatamente, um senhor saiu do balcão e veio me perguntar sobre o que eu estava procurando. Acabei levando até um espanador, coisa que minha avó usava. Paguei em dinheiro, pois não aceitam cartões, cheques e fazem questão de espalhar plaquinhas bem-humoradas para a pergunta-afirmação "crédito ou débito". Enquanto aguardava o troco, outro senhor listava à mão item por item que eu comprei num caderno cheio de margens. Perguntou meu nome e escreveu corretamente, com o "d" mudo e sem dobrar o "l". Desde então, quando passo na portinha, recebo um aceno. Fico imaginando a moça dos Correios fechando a agência e tomando um cafezinho açucarado com eles. 

No sacolão onde vou aos sábados - outra portinha -, mesmo escolhendo tudo com calma no meu boitempo, não me canso de ter surpresas agradáveis. Hoje, a dona do lugar me sugeriu trocar o mamão que eu acabara de escolher. "Muito verde. Mesmo se amadurecer, não ficará tão saboroso quanto os mais laranjinhas". Troquei e comentei que verde assim só para o doce de mamão caseiro. Ela sorriu e retrucou: "ah não, aquele verde, verde era do quintal da avó. Ela sabia qual era o melhor para colher. Este nunca ficará igual". 

Saí com gosto de doce em calda de lá.






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