Já que eu ando sumida
A Moça do Guichê - publicada na minha última coluna de setembro, no Pandora
Anos atrás, saí do teatro impressionada com o espetáculo “Pessoas Invisíveis”, da companhia curitibana Armazém. A peça, inspirada nos quadrinhos do genial Will Eisner, mostrava como, numa grande cidade, certos personagens pareciam simplesmente não existir. Não se trata apenas dos marginalizados, como o bêbado ou a prostituta. O porteiro e a faxineira entram no pacote. E há uma frase, atribuída a Luis Fernando Verissimo, que diz: “Uma pessoa que é boa com você, mas grosseira com o garçom, não pode ser uma boa pessoa”. Não sei se a frase é dele, no entanto, para mim, sempre fez muito sentido.
Penso na peça, na frase e na minha formação quando acordo com o pé esquerdo. Nos dias normais, não preciso do exercício. Não deixo de entrar na academia de ginástica sem desejar um bom dia para a recepcionista, não economizo em “por favor” e “obrigada” para o atendente da padaria, e fico profundamente incomodada quando alguém ao meu lado assume esse “superpoder” de transformar o outro em nada. Na semana passada, minhas regras de conduta ficaram abaladas.
Estávamos eu e uma amiga no cinema de um shopping, fugindo da temperatura de 37°C que o termômetro marcava na rua. O ambiente climatizado era uma bênção, dava até para usar um casaquinho leve. Por isso, foi um choque quando chegamos naquele aquário para pagar o estacionamento, onde a sensação térmica beirava o inferno.
Uma senhora cheia de sacolas estava reclamando. Não era do preço, muito menos da atitude da moça. Ela argumentava que era simplesmente desumano permitir que alguém trabalhasse naquelas condições. “Se eu não aguento ficar aqui cinco minutos, imagina essa moça o dia inteiro? Isso sim é um trabalho escravo!”, disse, olhando para nós. Eu e minha amiga concordamos, argumentamos que o mínimo que a administração deveria fazer era instalar um ventilador ali.
A moça, maquiada e uniformizada, apenas nos retribuiu com um sorriso. Ela precisa do trabalho, afinal. Talvez se reclamássemos com seus chefes seria bem pior, e isso me entristeceu. O meu “boa tarde” naquele dia não levou nenhuma “estrelinha dourada”. É preciso mais do que ser educado, do que ler Dalai Lama, do que propagar as palavras do profeta Gentileza. É preciso descobrir uma "criptonita" que destrua esse nosso "superpoder" de tornar o outro invisível.
Anos atrás, saí do teatro impressionada com o espetáculo “Pessoas Invisíveis”, da companhia curitibana Armazém. A peça, inspirada nos quadrinhos do genial Will Eisner, mostrava como, numa grande cidade, certos personagens pareciam simplesmente não existir. Não se trata apenas dos marginalizados, como o bêbado ou a prostituta. O porteiro e a faxineira entram no pacote. E há uma frase, atribuída a Luis Fernando Verissimo, que diz: “Uma pessoa que é boa com você, mas grosseira com o garçom, não pode ser uma boa pessoa”. Não sei se a frase é dele, no entanto, para mim, sempre fez muito sentido.
Penso na peça, na frase e na minha formação quando acordo com o pé esquerdo. Nos dias normais, não preciso do exercício. Não deixo de entrar na academia de ginástica sem desejar um bom dia para a recepcionista, não economizo em “por favor” e “obrigada” para o atendente da padaria, e fico profundamente incomodada quando alguém ao meu lado assume esse “superpoder” de transformar o outro em nada. Na semana passada, minhas regras de conduta ficaram abaladas.
Estávamos eu e uma amiga no cinema de um shopping, fugindo da temperatura de 37°C que o termômetro marcava na rua. O ambiente climatizado era uma bênção, dava até para usar um casaquinho leve. Por isso, foi um choque quando chegamos naquele aquário para pagar o estacionamento, onde a sensação térmica beirava o inferno.
Uma senhora cheia de sacolas estava reclamando. Não era do preço, muito menos da atitude da moça. Ela argumentava que era simplesmente desumano permitir que alguém trabalhasse naquelas condições. “Se eu não aguento ficar aqui cinco minutos, imagina essa moça o dia inteiro? Isso sim é um trabalho escravo!”, disse, olhando para nós. Eu e minha amiga concordamos, argumentamos que o mínimo que a administração deveria fazer era instalar um ventilador ali.
A moça, maquiada e uniformizada, apenas nos retribuiu com um sorriso. Ela precisa do trabalho, afinal. Talvez se reclamássemos com seus chefes seria bem pior, e isso me entristeceu. O meu “boa tarde” naquele dia não levou nenhuma “estrelinha dourada”. É preciso mais do que ser educado, do que ler Dalai Lama, do que propagar as palavras do profeta Gentileza. É preciso descobrir uma "criptonita" que destrua esse nosso "superpoder" de tornar o outro invisível.
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